top of page

Francisco Galeno: O Piauí é aqui — O Piauí não é aqui

  • MA Cult
  • 20 de dez. de 2024
  • 3 min de leitura

A mostra fica em cartaz até 25 de janeiro de 2025 na Galatea Oscar Freire SP



Ao fincar bandeira no Planalto Central, o artista visual Francisco Galeno conecta espaços e tempos até então desconexos. O Piauí é aqui — O Piauí não é aqui fica em cartaz até 25 de janeiro de 2025 na Galatea. Imagem: galatea.art


A costa norte do litoral nordestino brasileiro é demarcada por sua exposição perene à força eólica, motivo pelo qual as jangadas, com suas velas coloridas içadas em curvatura hiperbólica, tornaram-se uma alegoria comumente atribuída aos navegadores marítimos da região, aos quais convergem técnicas construtivas originárias distintas, somando o conhecimento da cultura material à ciência imaterial transmitida dos povos ribeirinhos aos costeiros, em influxos que se retroalimentam como vasos intercomunicantes; ou, melhor retratado, caminhos de água que se arvoram, entropicamente, culminando numa foz em estuário resultante da chegada do rio que (como artéria) cruza sertões, cerrados e campinas até abrir-se ao oceano (por entre veios e tal qual veias) no Delta do Parnaíba.

 

Dentre a quase centena de ilhas fluviais por entre as quais se descortina uma miríade de ecossistemas autóctones, em pleno Meio Norte do Brasil, zona de transição entre os biomas centristas e amazônicos, destaca-se a Ilha Grande de Santa Isabel, a maior em extensão territorial do arquipélago, além de ser também a mais densamente povoada: nascido neste marco de colisão, e coalizão, entre geografias humana e física, Francisco Galeno congrega, como que numa estratigrafia genealógica, um conjunto transversal de sabedorias ancestrais — seu bisavô, mestre canoeiro; seu avô, artesão coureiro; seu pai, construtor marceneiro; sua mãe, artista rendeira. Ao alimentar-se das raízes, brotaram frutos nutridos por uma árvore familiar cuja cultura é imbricada com seu cenário natural.

 

A renda de bilro — técnica advinda da colonização portuguesa, bastante presente nas rotas de navegação que ligavam os fortes da ocupação nordestina à nortista (estando a cidade de Parnaíba a meio caminho entre grandes centros urbanos como Recife, em Pernambuco, e Belém, no Pará) — é, a dias de hoje, um marco de cruzamento cultural entre tradições europeias e indígenas, sendo a Ilha Grande reconhecida em específico por sua centralidade regional no desenvolvimento desta tecnologia social, pois se trata de uma articulação comunitária, com demarcada presença do saber-fazer nativo feminino. O artista, até meados de sua primeira década de vida, esteve exposto não somente à visualidade advinda de tal práxis, mas também, e sobretudo, ao seu contexto.

 

Tensionando os limiares entre pintura e escultura, o artista constrói ali uma de suas obras mais importantes — com vontade construtiva e viés concretista (desta vez, literal) — através do árduo trabalho de calcetamento com pedras portuguesas na orla do lago Veredinha. Tal calçada, meio de expressão plástica cuja potência para visualidade geométrica já adquirira reconhecimento internacional na capital federal anterior à edificada na década de 1960, torna-se patrimônio cultural reconhecido, antes pela própria população citadina. Sua obra a céu aberto ancora a memória emigrante na forma de espacialidade transeunte. É, portanto, somente em 1990 que esta nova identidade “piauiense-brasiliensis” dá forma à sua historicidade, apropriada por seu povo via arte pública.

 

Francisco Galeno, ao fincar bandeira no Planalto Central, conecta espaços e tempos até então desconexos. Sua geometria, tão côncava quanto convexa, vê-se de fora para dentro, e de dentro para fora. Não à toa, destino e origem desenham as formas do agora.

 

A exposição Francisco Galeno: O Piauí é aqui — O Piauí não é aqui, fica em cartaz até 25 de janeiro de 2025 na Galatea, rua Oscar Freire, 379 – Lj. 1, Jardins – SP com horário de funcionamento de terça à quinta das 10 às 19h, sexta das 10 às 18h e, sábado das 11h às 17h.

 

Saiba mais aqui.

 

Comentarios


bottom of page